Redação do Site Inovação Tecnológica - 21/07/2011
Superposição, entrelaçamento e decoerência
A decoerência quântica é um fenômeno que pode fazer uma ponte entre o mundo regido pela mecânica quântica e o mundo regido pela mecânica clássica. [Imagem: Till Jahnke/University Frankfurt] |
No futuro, estão os computadores quânticos. Entre nós e eles, entre outros obstáculos, está um fenômeno chamado decoerência.
Os computadores quânticos não terão bits, terão qubits.
Um bit quântico tem a estranha capacidade de guardar um 0 e um 1 ao mesmo tempo - é isto que lhes permitirá fazer cálculos a uma velocidade que fará os supercomputadores de hoje parecerem ábacos.
A mecânica quântica estabelece que a matéria pode estar em mais de um estado físico ao mesmo tempo - pense, por exemplo, em uma "moeda quântica", que seria capaz de dar cara e coroa ao mesmo tempo.
Esse estado "misto", chamado de estado de superposição, é bem conhecido dos físicos, e funciona muito bem em objetos pequenos - elétrons, por exemplo.
Mas sistemas físicos maiores e mais complexos - qubits, por exemplo - parecem estar em um estado físico consistente porque interagem e se "entrelaçam" com outros objetos em seu ambiente.
Este entrelaçamento - há quem prefira emaranhamento - faz com que esses objetos mais complexos "decaiam" para um único estado - cara ou coroa, por exemplo. É este processo de quebra da "mágica quântica" que os físicos chamam de decoerência.
A decoerência é uma espécie e ruído, ou interferência, atrapalhando as sutis inter-relações entre as partículas quânticas. Quando ela entra em cena, a partícula que estava no ponto A e no ponto B ao mesmo tempo, subitamente passa a estar no ponto A ou no ponto B.
Ora, eliminada a superposição, cai por terra também o promissor potencial dos computadores quânticos.
Controlando a decoerência
A decoerência é uma espécie e ruído, ou interferência, atrapalhando as sutis interrelações entre as partículas quânticas. [Imagem: QNL/Berkeley] |
Agora, pela primeira vez, um grupo de físicos conseguiu domar a decoerência em um sistema com muitas moléculas - um sistema quântico complexo, como os usados nos primeiros experimentos de computação quântica.
"Pela primeira vez fomos capazes de prever e controlar todos os mecanismos ambientais da decoerência em um sistema muito complexo, neste caso uma grande molécula magnética chamada 'molécula de ferro-8'," explicou Phil Stamp, físico da Universidade da Colúmbia Britânica, no Canadá.
A molécula de ferro-8 é um cristal magnético individual, algo como um ímã molecular. Como são puras, essas moléculas ficam praticamente imunes à decoerência externa. Desta forma, os cientistas puderam trabalhar detalhadamente com a decoerência interna, que faz a superposição quântica colapsar "de dentro para fora", por assim dizer.
Os pesquisadores calcularam todas as fontes de decoerência em seu experimento como uma função da temperatura, do campo magnético e pela concentração nuclear isotópica.
Com esses dados, eles identificaram as condições ótimas para operar os qubits, reduzindo a decoerência em aproximadamente 1.000 vezes.
Hardware da computação quântica
A molécula de ferro-8 é um cristal magnético individual, algo como um ímã molecular. [Imagem: UBC] |
"Nossa teoria também prevê que poderemos suprimir o decoerência, e levar a taxa de decoerência no experimento a níveis muito abaixo do limiar necessário para o processamento de informação quântica, através da aplicação de fortes campos magnéticos," afirmou.
No experimento, os pesquisadores prepararam uma série cristalina de moléculas de ferro-8 em uma superposição quântica, onde a magnetização líquida de cada molécula foi simultaneamente orientada para cima e para baixo.
O decaimento dessa superposição, causado pela decoerência, foi então observado no tempo - e a decadência foi incrivelmente lenta, comportando-se exatamente como a nova teoria prevê.
O resultado experimental são qubits que permanecem intactos por até 500 microssegundos, uma "eternidade" em termos quânticos - imagine que as memórias eletrônicas atuais operam na faixa dos nanossegundos.
"As moléculas magnéticas agora parecem ter um sério potencial como candidatas para o hardware da computação quântica," disse Susumu Takahashi, coautor do estudo.
Big Bang
Mas o estudo tem também um largo alcance também na física fundamental, para o entendimento do mundo conforme viajamos da escala atômica para a escala humana, e daí até a escala cósmica.
"A decoerência ajuda a unir o universo quântico dos átomos e o universo clássico dos objetos cotidianos com os quais interagimos," explicou Stamp. "Nossa capacidade de entender tudo, do átomo ao Big Bang, depende do nosso entendimento da decoerência, e os avanços na computação quântica dependem da nossa capacidade de controlá-la."
Bibliografia:
Decoherence in crystals of quantum molecular magnets
S. Takahashi, I. S. Tupitsyn, J. van Tol, C. C. Beedle, D. N. Hendrickson, P. C. E. Stamp
Nature Physics
20 July 2011
Vol.: Published online
DOI: 10.1038/nature10314
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