Há poucas semanas, outra equipe demonstrou que os exercícios evitam e até revertem a perda de neurônios no coração. Imagem: Marcelo Hiro Akiyoshi |
Há poucos
anos, ter uma doença cardíaca era virtualmente uma "condenação"
a um repouso absoluto, fugindo de qualquer esforço físico que
pudesse representar uma carga adicional para o coração.
Hoje, ao
contrário, a prática regular de atividade física tem-se firmado
como uma importante forma de tratamento para a insuficiência
cardíaca - doença caracterizada pela incapacidade do coração de
bombear sangue adequadamente.
Os
benefícios vão desde prevenir a caquexia - perda severa de peso e
massa muscular - até o controle da pressão arterial, a melhora da
função cardíaca e o retardo do processo degenerativo que causa a
morte progressiva das células do coração e leva à morte 70% dos
afetados pela doença nos primeiros cinco anos.
Pesquisadores
a Universidade de São Paulo (USP) descobriram agora uma parte dos
mecanismos fisiológicos pelos quais o exercício aeróbico protege o
coração doente.
"Basicamente,
o que descobrimos é que o treinamento aeróbico facilita a remoção
de mitocôndrias disfuncionais nas células cardíacas," contou
Júlio César Ferreira, professor do Instituto de Ciências
Biomédicas que está orientando o trabalho da pesquisadora Juliane
Cruz Campos.
As
mitocôndrias são as organelas responsáveis por produzir energia
para as células. "A remoção dessas organelas promove um
aumento na oferta de ATP [adenosina trifosfato, molécula que
armazena energia para a célula] e reduz a produção de moléculas
tóxicas, como os radicais livres de oxigênio e os aldeídos
reativos, que em excesso danificam as estruturas celulares",
acrescentou.
Em
uma pesquisa anterior, a equipe já havia mostrado por meio de
experimentos com cobaias que o treinamento
aeróbico combate a insuficiência cardíaca reativando um
complexo intracelular conhecido como proteassoma - principal
responsável pela degradação de proteínas danificadas.
Os
resultados mostraram ainda que, no coração de portadores de
insuficiência cardíaca, a atividade desse sistema de limpeza
diminui mais de 50% e, consequentemente, proteínas altamente
reativas começam a se acumular no citoplasma, interagindo com outras
estruturas e causando a morte das células cardíacas.
Agora,
eles descobriram que a atividade física também regula a atividade
de outro mecanismo de limpeza celular conhecido como sistema de
autofagia - cuja descoberta rendeu o Nobel de Medicina ao cientista
japonês Yoshinori Ohsumi, em 2016.
"Em
vez de degradar proteínas isoladas, esse sistema cria uma vesícula
[autofagossomo] em volta de organelas disfuncionais e transporta todo
esse material de uma só vez até uma espécie de incinerador, o
lisossomo. Lá dentro, existem enzimas que destroem o lixo celular.
No entanto, observamos que no coração de ratos com insuficiência
cardíaca esse fluxo autofágico está interrompido, o que faz com
que mitocôndrias disfuncionais comecem a se aglomerar",
explicou Júlio César.
De acordo
com o pesquisador, a mitocôndria chega a se dividir, isolando a
parte danificada para facilitar sua remoção. Isso foi possível
constatar ao analisar a atividade de proteínas relacionadas com o
processo de divisão mitocondrial. Porém, o sistema que deveria
transportar o material rejeitado até o lisossomo não consegue
completar a tarefa.
Segundo o
pesquisador, o objetivo da pesquisa no longo prazo é identificar
alvos intracelulares que possam ser modulados por meio de fármacos
para promover pelo menos parte dos benefícios cardíacos obtidos com
a atividade física.
"Claro
que não queremos criar a pílula
do exercício, isso seria impossível, pois ele atua em muitos
níveis e em todo o organismo. Mas talvez seja viável, por meio de
um medicamento, mimetizar ou maximizar o efeito positivo da atividade
física no coração.
"Nossos
resultados mostram que a atividade física não só previne, como
também reverte os danos causados pela insuficiência cardíaca.
Nossa hipótese é que o treinamento físico module a expressão e/ou
atividade de uma ou mais proteínas-chave envolvidas no processo
denominado 'mitofagia', a autofagia mitocondrial, restaurando então
sua atividade. É o que agora estamos tentando descobrir,"
comentou Júlio César.
De acordo
com o pesquisador, quando identificados, esses genes e as proteínas
por eles codificadas poderiam ser testados como alvos terapêuticos.
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